
Lotar agenda (parte 01)
Entendo o marketing. Sério mesmo. Estive ali por décadas, muito mais na linguagem, mensagem e comunicação do que na venda. Mas elas estão conectadas, portanto fico impressionado como há exageros na simplificação dos temas, gerando mais angústia do que respostas.
Entre as várias mensagens, estou destacando o “lotar agenda” para tentar organizar algum raciocínio sobre como posts com esse conteúdo são danosos às dinâmicas de saúde mental, principalmente para o psicanalista iniciante que está tentando montar seu manejo clínico e encontrar seu fio condutor na persona adotada nas redes sociais.
Só quem já está na jornada há algum tempo sabe como é a complexidade do acolhimento psicanalítico. Muitas vezes, os impactos que temos à respeito da psicanálise são focados em uma nova vertente profissional, como se pensar a psicanálise fosse organização de pensamento cartesiano. Inicia-se um caminho tortuoso de entidades que se colocam como transmissoras da psicanálise como se fosse um “curso” qualquer quando, na verdade, ela se assemelha mais a um percurso (e, aqui, já podemos começar uma elaboração acerca das palavras além das palavras, algo inerente à transmissão da psicanálise). Percurso é uma continuidade, pois a jornada psicanalítica, a quem se aventura realmente por ela, não tem fim.
Muitas angústias são criadas a partir destas mensagens distorcidas. E o “lotar agenda” é uma delas. Se o interessado pela psicanálise estiver iniciando a jornada pensando em atender de uma em uma hora, por exemplo, estará fadado à angústia e ao não-exercício da Escuta, pois a demanda de atenção e todo o ferramental proposto por Freud não é produtizável. Não é uma conversa. Não é ouvir.
A Escuta mexe conosco. Mesmo nos atravessando, deixa marcas no processo. E para elaborá-las de forma saudável, deve haver tempo para si entre sessões para que nossa psique possa (re)constituir-se. Não é um processo simples. Cada Escuta e sessão são únicas e singulares, mesmo com os mesmos analisantes. A condição continente é que se receba tais estrangeiros em um espaço sem interferências de outros.
Afinal, quem busca um espaço de acolhimento, quer estar em um ambiente lotado?
(continua)